Em recente decisão, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entendeu que imóvel adquirido com saldo do FGTS de um dos cônjuges não é passível de ser partilhado em caso de divórcio.
No caso em questão, um dos cônjuges – durante o casamento – fizera uso de seu saldo do FGTS para quitar financiamento de imóvel adquirido antes do matrimônio. No divórcio, o outro cônjuge pretendeu que a partilha incluísse o valor usado para a quitação do financiamento, sob a alegação de que tal quitação ocorrera na constância da união e que, portanto, haveria comunicação de bens para efeitos de partilha.
Na decisão (Agravo Interno nº 70083784843), o TJ/RS negou a pretensão de partilha do valor usado na quitação do financiamento, pois, para aquela Corte, valores provenientes de FGTS são incomunicáveis, ainda que utilizados na constância do casamento para a compra ou quitação de imóvel. Para o Tribunal somente são partilháveis no divórcio as demais parcelas de financiamento pagas durante o relacionamento, afastando o valor pago com o FGTS.
No regime da comunhão parcial de bens, a partir da união, os bens adquiridos onerosamente na constância do casamento são comunicáveis e devem ser partilhados igualitariamente em caso de divórcio. É o que dispõe o art. 1.658 do Código Civil.
O mesmo tratamento é dado à partilha de bens na dissolução da união estável que adota formalmente o mesmo regime e, também, na união estável não formalizada
Com isso, tudo o que for adquirido (bens e dívidas) durante a relação (casamento ou união estável) é dividido meio a meio, independentemente de qual tenha sido a contribuição de cada cônjuge ou companheiro para a consecução do resultado patrimonial. Em caso de divórcio, esses bens serão partilhados em igual proporção.
Entretanto, existem exceções sobre essa comunicabilidade, e elas estão previstas no art. 1.659 do Código Civil.
No tocante ao FGTS, trata-se de tema de grande divergência, tanto nos tribunais, como no meio doutrinário.
Há quem entenda que o FGTS deve ser partilhado, uma vez que o seu saldo, se utilizado para o sustento da família e a aquisição de bens, acaba por integrar o patrimônio comum do casal, perdendo a sua característica de incomunicável.
Em contrapartida, outra corrente defende que o FGTS é um direito personalíssimo, pois se trata do provento pessoal do trabalho, não sendo, jamais, bem comum partilhável em caso de divórcio.
No caso aqui analisado, o imóvel havia sido adquirido antes do casamento e, portanto, jamais fora bem comum, e sim, bem particular, sendo seu financiamento liquidado por meio de utilização de saldo FGTS (também bem particular).
Sendo assim, para o TJRS esses valores tiveram destinação específica, não podendo ser incorporado ao patrimônio comum do casal. Esse entendimento possui, como base, o instituto da sub-rogação real, que se baseia na substituição de uma coisa em lugar de outra. No caso específico, sendo o saldo de FGTS personalíssimo e não comunicável, a sua utilização na quitação de financiamento imobiliário não altera o seu caráter original de bem particular.
Trata-se de decisão relevante, uma vez que pode servir de embasamento para companheiros e cônjuges que decidam adquirir bens com seus saldos de FGTS sem temer a perda da natureza incomunicável desses saldos.
Para a devida proteção patrimonial, o mais adequado, no entanto, é que se faça constar expressamente na escritura dos bens adquiridos que os recursos proveem de saldos de contas de FGTS, facilitando a sua exclusão de partilha em caso de divórcio, dissolução de união estável e até mesmo de meação em caso de falecimento.
Ana Bárbara Zillo é advogada júnior do departamento de wealth planning do Battella, Lasmar & Silva Advogados.