No decorrer destes últimos anos, tivemos a oportunidade de cuidar de muitas ações que tratam da tributação da herança e doações com origem no exterior. Com a decisão proferida recentemente pelo STF, não há mais dúvidas: é vedado aos Estados e o Distrito cobrarem o ITCMD sobre a descrita situação fática.
Mas podem os Estados, no futuro, virem a exigir a cobrança do tributo? Certamente! O que aconteceu, em resumo, foi uma ausência de formalidade, desrespeitada pelos Estados e Distrito Federal, ao publicarem leis que instituíam a cobrança de ITCMD sobre heranças e doações oriundas de estado estrangeiro. Dita formalidade se deve ao fato de que, para que pudessem ser editadas leis estaduais, deveria o Congresso Nacional ter editar uma Lei Complementar, regrando toda a matéria e legitimando a cobrança do tributo.
Até o presente momento, a Lei Complementar não foi editada, mas em tempos de sangria dos cofres públicos pela Covid-19, a probabilidade de vir a ser é bem elevada, pois a arrecadação dos estados, com a decisão proferida pelo STF, sofreu duro um duro golpe. Um dos projetos que tramita no Congresso é o Projeto de Lei Complementar nº 363/2013, de autoria da Deputada Erika Kokay – PT/DF, que cuida da matéria. Para o que interessa, será cobrado o ITCMD:
“…nos casos em que houver conexão relevante com o exterior:
“a) pelo Estado onde for domiciliado ou residir o donatário, se o doador tiver domicílio no exterior, ou o Distrito Federal;
b) pelo Estado onde tiver domicílio ou residir o sucessor, se o de cujus tiver seu inventário ou arrolamento processado no exterior, ou o Distrito Federal;
c) pelo Estado onde se processar o inventário ou arrolamento, se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado no exterior, ou o Distrito Federal”.
Nas letras a e b, tanto nos casos de doação, quanto de herança, a cobrança do ITCMD recai sobre o domicílio do donatário e sucessor, respectivamente. Exemplo: Xisto, residente e domiciliado no Acre, recebe como bem herdado pelo falecimento de seu pai, imóvel localizado em Marrocos. Nesse caso, o acreano terá que pagar o ITCMD ao estado domiciliado. E se houver tributação em Marrocos sobre o mesmo fato – herança, pode haver bitributação? Sim, pode haver, mas o que pode – e deve – ser levado em consideração é eventual acordo internacional bilateral entre os países, de modo que essa tributação ocorra somente em um território internacional, ou caso ocorra, compense-se o tributo já recolhido em estado estrangeiro com o devido em território nacional.
No que diz respeito à letra c, a regra geral é a competência de onde se processa o inventário ou arrolamento, se o falecido tinha bens, era residente ou domiciliado no exterior. Outro exemplo: Fritz, cidadão residente e domiciliado em Londres, possui uma linda pousada em Itacaré/BA. Quando de seu falecimento, terá direito o estado à cobrança de ITCMD sobre o imóvel. A mesma consideração sobre a bitributação aqui se aplica.
O que se depreende do atual panorama é o seguinte: não tarda para que os entes estatais operacionalizem a instituição do ITCMD sobre heranças e doações advindas do exterior, é só uma questão de tempo.
Com a edição da Lei Complementar pelo Congresso Nacional, passam os estados a deter total competência para a cobrança, desde que cada um edite sua própria lei interna. Daí a importância de se organizar patrimonialmente, buscando profissionais gabaritados para traçar em efetivo planejamento patrimonial, com vistas a minimizar a carga tributária.
Artur Francisco da Silva, é advogado do departamento de wealth planning do Battella, Lasmar & Silva Advogados e coautor do e-book Regimes de Bens e seus Efeitos na Sucessão, da Editora B18.