O art. 6º, inciso XIV da Lei nº 7.713/1988 estabeleceu isenção de imposto de renda sobre os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional e outras doenças. Dúvidas sobre a aplicação dessa isenção têm feito com que muitas pessoas deixem de usufruir esse benefício fiscal e, por isso, iremos esclarecer a sua extensão.
Os limites desse dispositivo legal foram fixados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Quanto à extensão dos efeitos da isenção IR para outras doenças graves não elencadas na lei, o STJ, em julgamento do REsp 1.116.620/BA, firmou a tese de que o conteúdo normativo do art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88, com as alterações promovidas pela Lei nº 11.052/2004, é explícito em conceder o benefício fiscal em favor dos aposentados portadores das seguintes moléstias graves: moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma.
Por essa razão, a lista de moléstias contida nesse dispositivo legal é taxativa (numerus clausus), vale dizer, restringe a concessão de isenção às situações nele enumeradas. Ou seja, apenas as pessoas acometidas pelas doenças expressamente mencionadas no dispositivo legal podem se beneficiar da isenção do imposto de renda.
Essa também foi a interpretação do STF. No mais recente julgado sobre a possibilidade de extensão dos benefícios da legislação para contribuintes não expressamente abrangidos pela legislação (ADI nº 6025/DF), por maioria, o STF firmou o entendimento de que o art. 6º, inciso XIV da Lei nº 7.713/1988 é constitucional, e que o Poder Judiciário está impossibilitado de atuar como legislador para ampliar a concessão do benefício tributário aos contribuintes não expressamente abrangidos pela legislação.
Em relação ao termo inicial do benefício, o STJ firmou o entendimento de que deve ser a data em que foi comprovada a doença, ou seja, a data do diagnóstico médico, e não a da emissão do laudo oficial.
Esse entendimento é importante, pois permite ao contribuinte se beneficiar da isenção do imposto de renda a partir do momento do diagnóstico. Caso o contribuinte tenha recolhido imposto de renda sobre os proventos de aposentadoria ou reforma após o diagnóstico, poderá requerer a restituição dos valores pagos.
Outro limite importante trata da não obrigatoriedade de contemporaneidade dos sintomas ou a recidiva. Em recente julgamento (REsp 1.836.364/RS), a primeira turma do STJ reafirmou que o sucesso no tratamento de uma doença grave não afasta o direito ao benefício de isenção do imposto de renda previsto na legislação.
Esse tema já era pacificado no STJ desde 2018, sendo questão principal da Súmula 627.
Trata-se de questão importante, pois muitas vezes o contribuinte deixa de pleitear o benefício tributário após tratamento de saúde bem-sucedido ou por não apresentar sintomas graves da doença.
Uma questão ainda não pacificada, mas com bons precedentes, trata da aplicabilidade do benefício tributário da isenção do imposto de renda sobre proventos de aposentadoria ou reforma aos rendimentos pagos por plano de aposentadoria privada.
O último julgamento sobre o tema (REsp 1.507.320/RS) definiu que a isenção do IR prevista no artigo 6º, XIV, da Lei nº 7.713/88 abrange quaisquer proventos da inatividade, sejam aqueles pagos pela previdência pública, sejam complementares, não fazendo a lei qualquer distinção, assim como sobre o resgate de tais contribuições, sendo o autor portador de doença incapacitante.
A previdência privada é tratada na seção da previdência social da Constituição Federal, o que em si já legitimaria a aplicação do benefício tributário sobre seus rendimentos. No entanto, o caráter previdenciário da aposentadoria privada foi consolidado no Regulamento do Imposto de Renda (Dec. nº 9.580/2018), que estabeleceu em seu art. 35, §4º, inciso III, a isenção de IR sobre os valores pagos a título de complementação de aposentadoria, reforma ou pensão.
Por fim, em julgamento do REsp 1.814.919/DF (Tema 1.037), o STJ firmou entendimento de que não se aplica a isenção de IR prevista no inciso XIV do art. 6º da Lei nº 7.713/1988 aos rendimentos de portador de moléstia grave que se encontre no exercício de atividade laboral. Ou seja, o benefício tributário é aplicável somente aos contribuintes inativos.
Baseados no art. 111, inciso II do Código Tributário Nacional, os magistrados firmaram entendimento de que a legislação que disponha sobre isenção tributária deve ser interpretada literalmente, não cabendo ao intérprete estender os efeitos da norma isentiva, por mais que entenda ser uma solução que traga maior justiça do ponto de vista social.
Para concluir, é importante dizer que, embora o STJ tenha enfrentado brilhantemente os temas referidos ao assunto, ainda existem algumas lacunas a serem preenchidas. Dentre as mais importantes, destacam-se aquelas relacionadas ao exterior. É preciso definir se os efeitos do benefício tributário previsto no art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713/1998 alcançam os proventos de aposentadoria pagos no exterior para residentes fiscais no Brasil. Também, é preciso definir se os efeitos do referido benefício tributário alcançam os proventos de aposentadoria pagos no Brasil para residentes fiscais de outro país.
Felipe Pereira Louzada é tributarista especializado em tributação de pessoa física, associado do Battella, Lasmar & Silva Advogados em São Paulo, e coautor do livro Renda Variável e do e-book Saída Definitiva do País – Guia Prática das Obrigações Tributárias, publicados pela Editora B18.