A caderneta de poupança é um dos investimentos mais populares do país, que conta com simplicidade e baixo risco, tendo por objetivo oferecer uma oportunidade, sem custo, para guardar dinheiro. Mas, qual a sua diferença em relação à conta corrente?
A poupança é uma conta de depósitos remunerada. Trata-se de uma reserva de valor para o enfrentamento de eventuais adversidades, enquanto meio de garantia contra fatos extraordinários que venham a atingir o investidor. A principal diferença entre a conta corrente e a poupança é o rendimento: enquanto a primeira é uma conta de depósito, a outra é um investimento.
Neste contexto, a conta corrente é feita para transações monetárias do dia a dia, como fazer transferências, pagar contas, receber dinheiro, fazer compras etc., de natureza circulatória e não como capital de guarda.
De acordo com a legislação atual[1], a remuneração dos depósitos de poupança é composta de duas parcelas:
- a remuneração básica, dada pela Taxa Referencial – TR, e
- a remuneração adicional, correspondente a: (a) 0,5% ao mês, enquanto a meta da taxa Selic ao ano for superior a 8,5%; ou (b) 70% da meta da taxa Selic ao ano, mensalizada, vigente na data de início do período de rendimento, enquanto a meta da taxa Selic ao ano for igual ou inferior a 8,5%.
A caderneta de poupança é o investimento mais popular e tradicional do país devido, principalmente, a sua simplicidade de aplicação e de resgate, com isenção de imposto de renda, oferecida pelas instituições financeiras públicas e privadas, por meio de contas bancárias chamadas de conta poupança.
Dessa forma, os valores depositados na conta poupança são aplicados automaticamente na caderneta de poupança, tem liquidez diária e sofrem remunerações mensais. Trata-se de uma aplicação segura e suas regras de funcionamento são estipuladas pelo Banco Central, por isso existe uma padronização de taxas e de funcionamento em todas as instituições financeiras.
Em face de seu caráter de investimento, como capital de guarda, para eventual adversidade futura, a Lei confere à caderneta de poupança a proteção da impenhorabilidade[2].
Portanto, a caderneta de poupança é impenhorável, mas não a conta poupança, modalidade de conta utilizada, frisa-se, muitas vezes, como se fosse conta-corrente.
Sob esta perspectiva, a característica de conta poupança, para ser protegida pela impenhorabilidade, deve ser consubstanciada materialmente, de modo a se registrar quais as transações que são nelas efetuadas no caso concreto.
Eventual constatação de movimentações intensas acaba por alterar sua natureza, transmutando-a em verdadeira conta-corrente, passível, de acordo com o Art. 854, caput, do Código de Processo Civil e a jurisprudência, de bloqueio judicial.
Com efeito, a proteção conferida pelo artigo 833, X, do CPC busca proteger valores de fato poupados pela parte.
Nesse sentido, já se posicionou o Superior Tribunal de Justiça, a saber:
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. CONTA-POUPANÇA. ACÓRDÃO A QUO QUE CONCLUIU PELA UTILIZAÇÃO DA CONTA POUPANÇA COMO CONTA CORRENTE EM RAZÃO DAS SUCESSIVAS MOVIMENTAÇÕES FINANCEIRAS. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. 1. No caso, o Tribunal de origem, atento ao conjunto fático-probatório dos autos, assentou que “verifica-se, a partir do extrato acostado às fls. 63/65, que a conta bancária nº 512.178-7 foi objeto de intensa movimentação, sendo realizados descontos e compensações de cheques, gastos com crédito e diversos saques, o que descaracteriza sua condição de conta-poupança. Na verdade, a forma de utilização da referida conta mostra maior proximidade material com uma conta-corrente, que, salvo as verbas de caráter alimentar, não está protegida pela impenhorabilidade do art.649, CPC.” (e-STJ fls. 191/192). Para se chegar a entendimento diverso do contido na decisão hostilizada, necessário seria proceder-se ao revolvimento das provas apresentadas, finalidade que escapa ao âmbito do apelo manejado, nos termos da Súmula nº 7 do STJ. 2. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp 511240/AL, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, julgamento em 19.03.2015).
As particularidades de cada caso devem ser analisadas para fins de alcançar o desiderato legal quanto à reserva de investimentos.
Ficando descaracterizada a sua natureza de caderneta de poupança em face de sua intensa movimentação, fica afastada a proteção da impenhorabilidade prevista no inciso X do artigo 833 do CPC, na qual busca proteger os valores efetivamente destinados a reserva, poupados pela parte.
Todavia, é ônus do credor comprovar o vício da conta poupança, qual seja a sua utilização desvirtuada para uma conta-corrente, com evidente natureza circulatória, com operações financeiras de crédito e débito.
Há vários mecanismos de produção de prova, como a requisição de extratos, além do suporte oferecido pelo sistema CCS-BACEN, por meio da opção denominada “relacionamento”, maximizando as possibilidades de identificação de eventual utilização de uma pessoa como “laranja” de outrem, fato que, infelizmente, não é incomum nas grandes contendas de crédito.
Protege-se, portanto, o capital de guarda, mas não o de circulação, o qual deve ser empenhado em prol da satisfação do débito exequendo, sendo inadmissível, nesta toada, o decreto de impenhorabilidade pelo simples fato da conta objeto de bloqueio judicial ser classificada como poupança, demandando análise das particularidades de sua movimentação.
Ausente, pois, o caráter de reserva indispensável ao numerário, é legítima a penhora sobre o valor depositado em conta poupança, sob pena de desvirtuamento, com o nítido intuito de frustrar a penhora dos bens dos devedores especializados.
Alexandre Assaf Filho é advogado especializado em direito societário e direito das startups, e associado do Reis Advogados, em Ribeirão Preto/SP.
[1] Lei nº 8.177/1991. Estabelece regras para a desindexação da economia e dá outras providências. Art. 12; Lei nº 8.660 de 28 de maio de 1993. Estabelece novos critérios para a fixação da Taxa Referencial – TR, extingue a Taxa Referencial Diária – TRD e dá outras providências. Art. 7º.
[2] Código de Processo Civil, Art. 833, inciso X.