Sem muito alarde, o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI) editou normativo que promoveu alterações importantes nos procedimentos de registro de sociedades limitadas, incluindo aquelas utilizadas no planejamento patrimonial e sucessório.
A Instrução Normativa DREI nº 112 foi publicada em 20 de janeiro de 2022 e tratou de regularizar, no que tange ao Registro Público de Empresas Mercantis, as alterações promovidas pela Lei Complementar nº 182/2021, Lei nº 14.195/2021, Lei nº 13.818/2019 e Lei nº 14.195/2021.
Das alterações regulamentadas, vale destacar a possibilidade da utilização do CNPJ como nome empresarial, levando-se em conta apenas o número raiz composto pelos 8 primeiros dígitos do CNPJ, seguidos da expressão abreviada “LTDA”.
Diante desta nova possibilidade, os sócios deverão indicar expressamente no ato de constituição ou alteração que desejam utilizar o número do CNPJ como nome empresarial, sendo que tal opção só valerá após o deferimento do registro.
Não se sabe ao certo a razão para essa permissão de uso do CNPJ como razão social, haja vista que antes, a denominação social ou razão social devia ser formulada a partir de uma palavra qualquer atribuída pelos sócios (conhecida como nome fantasia), restando a opção de usar ou não expressões que designassem o objeto social, sobretudo com objetivo de dar mais identidade/personalidade à pessoa jurídica.
Talvez a nova opção tenha o condão de trazer mais agilidade na constituição de sociedades com finalidades não operacionais, tais como Holdings Patrimoniais. No entanto, entendo que as empresas comerciais ou de serviços, que buscam destacar seus nomes ou marcas no mercado, não adotarão o CNPJ como denominação social de suas sociedades.
No que tange ao objeto social, agora também é possível indicar as atividades que serão desenvolvidas pela sociedade limitada com a descrição dos códigos integrantes da estrutura da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE, sendo vedada a descrição do objeto social que utilize, de forma exclusiva, códigos de atividades genéricos cujas redações contenham a expressão “não especificados anteriormente”, salvo se descrito em conjunto com outros CNAES que permitam a identificação das atividades propostas.
O objeto social sempre foi um ponto interessante das sociedades, pois muitos contratos sociais utilizam Cláusulas ou Artigos extensos para descrever as atividades do objeto social, sendo que, ao final, a sociedade é registrada com apenas um CNAE principal e um outro CNAE secundário, os quais muitas vezes não refletem as atividades descritas no ato societário.
Com a possibilidade do uso apenas dos códigos de atividades, as sociedades poderão minimizar eventuais equívocos na constituição, sobretudo no que tange aos possíveis enquadramentos para fins tributários, dado que o CNAE é a fonte primária para se determinar diversas alíquotas de impostos e regimes tributários.
Na parte da Administração, agora finalmente está formalizada no Manual de Registro de Sociedade Limitada – Anexo IV da Instrução Normativa DREI nº 81/2020, a possibilidade de o administrador de sociedade limitada no Brasil, ter sua residência e domicílio no exterior, desde que no processo de alteração para eleição do administrador não residente, ou arquivamento em processo apartado, seja anexada a procuração outorgada ao seu representante/procurador residente no Brasil, com poderes para, até no mínimo 3 anos após o término do mandato do administrador, receber citações e intimações em ações judiciais ou processos administrativos.
Essa possibilidade, já permitida às sociedades anônimas, ainda traz alguns desafios de ordem prática para sua implantação, haja vista que para qualquer alteração na administração de uma sociedade se faz necessária a elaboração do Documento Básico de Entrada (DBE) para informar os dados do novo administrador. No momento, o sistema do DBE ainda não permite a inserção de endereço no exterior no campo de dados do represente legal do CNPJ, que no caso de uma sociedade limitada normalmente é o administrador eleito.
Resta saber, na prática, se para fins de registro do ato societário contemplando a entrada do administrador não residente, a sociedade deverá manter um representante legal residente no Brasil, responsável pelo CNPJ, mas que não ocupe o cargo de administrador ou sócio administrador.
No campo das tão faladas Startups, as sociedades limitadas constituídas ou alteradas para se enquadramento como startup, deverão agora, para fins de registro, fazer constar em seus atos constitutivos ou de alteração, ou ainda por instrumento de enquadramento em processo apartado, a declaração dos sócios de que a sociedade se enquadra como startup, nos termos do art. 4º, § 1º, inciso III, alínea “a” da Lei Complementar nº 182/2021, que define o enquadramento como Startup da sociedade limitada, em constituição ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados.
Por fim, no que tange às quotas de sócio falecido em sociedade com dois ou mais sócios, a novidade é que diante do falecimento de um deles, abre-se a possibilidade para: (i) dissolução parcial por meio da liquidação das quotas do falecido, (ii) dissolução total da sociedade deliberada pelo sócio remanescente, ou (iii) sucessão das quotas do falecido.
Na dissolução parcial, a liquidação das quotas deliberada pelos sócios remanescentes independe da apresentação de alvará ou formal de partilha, e tampouco da ciência ou anuência prévia dos sucessores do sócio falecido, cônjuge ou inventariante. Para o arquivamento da alteração contratual de dissolução parcial, também não será exigida comprovação do pagamento das quotas aos sucessores do falecido, tal como estabelece o Art. 1.031 § 2º do Código Civil, ou outra regra no contrato social. Esse dispositivo da Lei Civil dispõe o seguinte:
Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
§2º A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário.
O que mais chama a atenção com relação à possibilidade de dissolução parcial trazida pela Instrução Normativa, reside no fato de que, mesmo havendo disposição no contrato social permitindo o ingresso de herdeiros e sucessores, essa possibilidade estará vinculada à vontade dos sócios remanescentes.
Se esses não tiverem interesse no ingresso dos herdeiros, poderão proceder com a alteração do contrato social e liquidar as quotas do falecido sem a necessidade de apresentação de alvará e/ou formal de partilha.
É bem possível que essa permissão enseje aumento dos litígios societários, na medida que o contrato social assinado pelos sócios enquanto vivos, com cláusula que permita o ingresso de herdeiros e sucessores, passa a ter sua validade condicionada à vontade dos sócios remanescentes.
Para a hipótese de dissolução total ou extinção da sociedade por falecimento de sócio, a regra é basicamente a mesma, não sendo necessária a apresentação de alvará judicial ou escritura pública de partilha de bens, especifica para a prática do ato, se os sócios remanescentes optarem pela dissolução total ou extinção da sociedade, ainda que haja responsabilidade do espólio.
Na hipótese de sucessão das quotas do sócio falecido, as regras seguem basicamente iguais, sendo necessária a apresentação do alvará judicial ou formal de partilha para que o ato de transferência de quotas do sócio falecido seja registrado, admitindo-se a substituição do alvará judicial por documento equivalente emitido pelo cartório de notas, no caso dos inventários extrajudiciais.
Resta saber, agora, se o “sistema sincronizado” entre Junta Comercial, Receita Federal, Secretarias de Fazendas dos Estados e Municípios, irá funcionar na prática para implantação das dessas alterações, haja vista que muitas vezes o sistema REDESIM não permite inserções que muitas vezes são exigidas pelas Juntas Comerciais dos Estados.
Ricardo Almeida Blanco é advogado especialista em planejamento patrimonial e sucessório e associado sênior do Battella, Lasmar & Silva Advogados, em São Paulo.
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O texto afirma que: “O que mais chama a atenção com relação à possibilidade de dissolução parcial trazida pela Instrução Normativa, reside no fato de que, mesmo havendo disposição no contrato social permitindo o ingresso de herdeiros e sucessores, essa possibilidade estará vinculada à vontade dos sócios remanescentes.”
Entretanto, a parte final da SEÇÃO IV, do item da IN 112, aduz que: “Não há liquidação de quotas quando se aplicarem as regras dos incisos do art. 1.028 do Código Civil, como quando o contrato dispuser de forma oposta à liquidação, quando os remanescentes optarem pela
dissolução total da sociedade ou quando, por acordo com os herdeiros, for regulada a substituição do sócio falecido.”, o que faz crer que havendo previsão no contrato para o ingresso dos herdeiros e sucessores, esta deve ser obedecida.