Mais um assunto de suma importância é pacificado pelo judiciário: a base de cálculo do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI.
De competência municipal, esse tributo é cobrado nas transmissões onerosas de bens imóveis. Essa mesma transmissão significa mudança de propriedade – compra e venda de imóveis – e não apenas da alteração da posse, o que ocorreria no caso de aluguel de imóvel.
Para compreender a questão, é necessário ter em mente o seguinte: qual o critério adotado pelos municípios para a cobrança do ITBI? É o valor venal do imóvel? É o valor da operação? E considerada uma dessas grandezas, como ocorre a cobrança? Vejamos, primeiro, a base de cálculo do ITBI.
Como regra geral, o Código Tributário Nacional (CTN) regula, em seu art. 38, a base de cálculo desse tributo, dispondo que será o valor venal dos bens e direitos transmitidos. Esse valor é estipulado pelo Poder Público, por critérios objetivos de metragem e localização, como o adotado no cálculo do IPTU.
No entanto, como o ITBI é imposto sobre a transmissão onerosa de bem imóvel, a jurisprudência consolidou o entendimento de que sua incidência recai sobre o valor do negócio jurídico. Explicando: numa operação típica de compra e venda de imóvel, geralmente aplica-se o valor de mercado ou do preço firmado entre as partes que realizaram a transação. O preço efetivamente pago pelo adquirente do imóvel tende a refletir, com grande proximidade, seu valor venal, considerado como o valor de uma venda regular, em condições normais de mercado. AREsp 847.280/PR
E, caso o órgão de fiscalização divirja do valor lançado pelas partes, tem à sua disposição o procedimento administrativo do art. 148 do CTN – incluído logo abaixo, que é o lançamento por arbitramento, para aferir a lisura da transação, e se o preço da negociação destoa por completo do valor venal.
Ocorre que a compra e venda imobiliária, assim como qualquer outro negócio jurídico dessa natureza, é permeada por muitos fatores subjetivos. Basta pensar que um bem pode ser posto à venda numa situação de penúria, de caráter urgente para a realização de um tratamento médico, e, por conseguinte, necessita ser realizada dentro da maior brevidade possível. Certamente, o preço, nesse caso, será abaixo do valor de mercado comumente praticado. E o contrário também se aplica, pois, uma supervalorização de um imóvel pode ocorrer rapidamente, com a implantação de melhoras no transporte público próximo à sua localização, a existência de benfeitorias que o diferenciam em relação a outros similares, e tantas outras condições atípicas.
Vejamos, agora, os aspectos do lançamento desse imposto.
Basicamente, ocorre de dois modos: por declaração ou por homologação. No primeiro, o contribuinte remete à autoridade competente os dados da operação – imóvel, valor etc… – e, de posse dessas, a Fazenda lança o valor do imposto. No segundo – homologação – a parte informa os dados da transação, recolhe o imposto, ficando condicionada a quitação à posterior verificação do ente tributante.
Em ambos os casos, o tipo de lançamento vai depender da lei local.
No lançamento por declaração, caso o Fisco divirja das informações, tem o dever de instaurar procedimento administrativo, com acesso ao contraditório e ampla defesa do contribuinte, e só então, pode (deve) lançar o ITBI. É o disposto nos artigos 147 e 148 do CTN:
Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.
§ 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela.
Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.
E no caso de ITBI sujeito à modalidade de lançamento por homologação, em que o contribuinte recolhe antecipadamente o imposto, tem o Fisco o prazo decadencial de cinco anos para proceder a revisão do pagamento, prazo que, uma vez alcançado, extinta estará a obrigação tributária.
Passada a introdução, linhas acima mencionamos que tanto o ITBI quanto o IPTU possuem base de cálculo que, segundo disposição legal, é vista como o valor venal do imóvel.
Só que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio do Recurso Especial nº 1937821, deu melhor interpretação ao tema, pontificando que não há vínculo entre as bases de cálculo dos dois tributos.
Firmou a Corte Superior que não há como atrelar as duas bases de cálculo, pois no IPTU, a cobrança ocorre por meio de lançamento de ofício, quando o município já possui todos os dados necessários para realizar a cobrança, visto que já possui em sua base de dados a Planta Genérica de Valores de imóveis, baseada em localização e metragem. Já o ITBI, a mesma municipalidade deve levar em conta o valor de mercado do imóvel, que pode flutuar por variadas razões, inclusive pelo ânimo entre vendedor e comprador.
Portanto, tem-se a impossibilidade de vinculação da base de cálculo do ITBI à estipulada para o IPTU, nem mesmo como piso de tributação, pois, repita-se, o valor adotado para fins de IPTU considera, apenas, os critérios fixados na Planta Genérica de Valores, que “são padrões de avaliação de imóveis em consonância com a metragem e com outros fatores, tais como localização, acabamento e antiguidade, ou seja, consistem em presunções relativas, no contexto da praticabilidade tributária, que auxiliam na fixação da base de cálculo desse imposto”. (STF, ARE 1245097)
E mais ainda, o valor venal não serve nem como parâmetro de referência para a municipalidade lançar o ITBI. É que, ao adotar essa métrica o Fisco desconsidera a variedade de fatores que podem influenciar numa operação de compra e venda de imóvel, como já mencionado acima. Tenta, desse modo, de maneira unilateral, estipular por quanto deve ser alienado o bem, cerceando por completo a livre vontade entre as partes.
E além disso, presume-se que as declarações prestadas no ato de alienação do imóvel sejam dotadas de boa-fé, o que só por meio de um procedimento administrativo poderiam ser refutadas, nos termos do citado art. 148 do CTN.
Em resumo, o STJ pacificou o assunto no seguinte sentido:
- a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação;
- o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN);
- c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.
Na prática, o que ocorria: as partes comunicavam o valor da operação ao Fisco municipal, com todos os dados da compra e venda. Após essa verificação, discordando, o fiscal lançava o valor que “achava” crível, tendo como parâmetro o valor venal cobrado no IPTU, e só após o pagamento, é que poderia haver o registro do imóvel.
Essa é outra prática considerada inconstitucional pelo STF, pois para o órgão, o ITBI só é devido a partir da transferência da propriedade imobiliária, efetivada mediante o registro em cartório – ARE 1294969, e não em momento que o anteceda, inclusive quando da assinatura do compromisso de compra e venda.
Desse modo, mais uma “reforma tributária” vai se consolidando pelo poder judiciário, e algumas, como a presente, vêm de ótimo grado, pois facilitam em muito a vida do contribuinte.
Artur Francisco da Silva é advogado do departamento de wealth planning e tax do Battella, Lasmar & Silva Advogados.
SAIBA MAIS SOBRE ITBI COM A NOVA EDIÇÃO DO NOSSO PLANEJAMENTO PATRIMONIAL:
Meu apartamento foi noventa mil reais terminei de pagar então vou pagar pelo itbi 2700 reais é isso
Se esse valor for maior do que o valor venal (e a alíquota for 3%), sim. Caso contrário, será usado o valor venal praticado no município do imóvel.