Por David Piesing
Dois dos principais dilemas enfrentados pelos instituidores de trusts discricionários internacionais são suas escolhas do trustee e do protetor.
Via de regra, um instituidor nomeia um trustee corporativo (e não uma pessoa física) que seja um provedor de serviços fiduciários de trusts devidamente regulamentado. As preocupações naturais do instituidor sobre entregar o controle de sua riqueza a um trustee terceirizado podem ser mitigadas ao se estabelecer uma Companhia Privada de Trust (Private Trust Company, ou PTC) para ser o trustee, mas esse mecanismo não é atraente ou conveniente para todas as situações. P
ortanto, muito frequentemente, os instituidores optam por incluir disposições de protetor no instrumento de trust, incluindo a necessidade de obter o consentimento prévio desse protetor antes que certos poderes discricionários relevantes possam ser exercidos pelo trustee, bem como concedendo ao protetor o poder de nomear e remover o trustee. O papel de protetor, muitas vezes, tem sido preenchido por um assessor de confiança do instituidor (o advogado da família, por exemplo), ou por um parente ou amigo próximo, residente em uma jurisdição fiscal que não cause problemas fiscais ao protetor.
Desde a introdução global (exceto nos EUA) do Padrão de Declaração Comum (Common Reporting Standard, ou – CRS) da OCDE desde 2016, os protetores de trusts descobriram que eles são divulgáveis como “pessoas reportáveis” pelo trustee dentro das normas de troca de informações. Dependendo de onde o protetor é residente para fins fiscais, isso pode causar sérias preocupações para eles.
Cartas de suas autoridades fiscais locais questionando por que o protetor não reportou anteriormente o trust (por exemplo, das Ilhas Cayman) em sua declaração de imposto de renda pessoal podem ser fáceis de explicar em alguns países, apresentando evidências claras de que eles não são nem o instituidor, nem um beneficiário ou um trustee do referido trust. Mas se o país em questão não for uma jurisdição que reconheça ou entenda trusts, ou se as autoridades fiscais são particularmente hostis, então isso pode ser uma experiência muito prolongada e dolorosa. Uma decisão feita como um favor ao instituidor muitos anos antes pode agora ser lamentada pelo protetor anos depois.
Outro motivo para o protetor agora estar relutante em continuar agindo é a mudança de dinâmicas do trust após a morte do instituidor. Essa morte pode ser o gatilho para beneficiários descontentes começarem a brigar entre si, o que é muito familiar quando crianças de diferentes casamentos estão entre os beneficiários, ou quando um ex-cônjuge questiona a validade do trust. O advogado da família, parente ou amigo pode se encontrar no meio da batalha, desejando não estar lá.
O parente como protetor pode até descobrir que seus próprios filhos estão no fogo cruzado, resultando em um conflito de interesses indesejável e desconfortável se eles precisarem tomar uma posição específica na discussão.
Nos dias de hoje, instituidores bem assessorados geralmente alertados sobre esses fatores e riscos, e é cada vez mais provável que a recomendação seja nomear um protetor independente, idealmente residente em uma jurisdição fiscalmente benigna onde o impacto de o protetor ser reportado sob o CRS não seja uma preocupação.
No entanto, isso significa que o instituidor estaria nomeando um protetor que ele mesmo não conhece muito bem, e que ainda não tem um entendimento completo da dinâmica da família ou das características dos beneficiários. Esse conhecimento requer um investimento de tempo para se desenvolver e construir.
Uma maneira ideal de preencher a lacuna de conhecimento de curto prazo, mas com um papel contínuo, é criar um Comitê Consultivo do trust. Isso poderia ser formalizado dentro do instrumento de trust, ou mantido muito informal através da carta de desejos.
Se o Comitê Consultivo de Trust for puramente consultivo, não tiver poderes decisórios e, portanto, não tiver responsabilidades fiduciárias, então a escolha de quem faz parte desse Comitê é ilimitada, e onde eles são residentes fiscais é irrelevante.
A título de exemplo, o Comitê poderia consistir em um parente próximo, do advogado local e do advogado internacional do instituidor. O papel poderia idealmente se adequar aos advogados que estiveram envolvidos em aconselhar a família por muitos anos, mas que se aposentaram ou estão prestes a se aposentar de sua prática jurídica, mas desejam permanecer envolvidos com a família.
O papel chave do Comitê Consultivo do Trust será fornecer informações e conselhos ao trustee independente e ao protetor independente sobre o status dos beneficiários para ajudá-los a exercer os poderes discricionários do trustee e os poderes de consentimento do protetor. Por exemplo, será que a situação conjugal delicada de um beneficiário poderia influenciar na decisão sobre uma vultosa distribuição do trust naquele momento? E um problema com abuso de substâncias ou doença grave? Talvez um vício em jogos de azar? Todos esses seriam fatores que o trustee e o protetor desejariam considerar, mas que poderiam comprometer a sua independência.
O uso de um Comitê Consultivo de Trust na prática internacional dos trusts, e na opinião do autor, pode ser uma ferramenta interessante, e também uma tendência, em situações que exigem a nomeação de protetores independentes.
David Piesing é especialista em governança de estruturas patrimoniais privadas com mais de 40 anos de experiência em serviços fiduciários e agente fiduciário licenciado (Licensed Personal Fiduciary) pela Comissão de Serviços Financeiros de Guernsey.
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