Por Bruno Lima e Moura de Souza
No Brasil, quando alguém falece, o processo de transferir seus bens para os herdeiros, conhecido como inventário, pode ser um caminho longo e complicado pelo sistema judicial. Não é raro encontrarmos casos de clientes, amigos e as vezes até em nossa própria família em que o inventário judicial se arrastou por anos a fio mesmo sem que houvesse qualquer tipo de discordância entre os herdeiros.
No entanto, desde 2007, com a Lei nº 11.441, foi possível realizar inventários e partilhas de forma mais rápida e menos burocrática, por meio de cartórios de notas, em casos em que todos os herdeiros são capazes e concordam com a partilha dos bens. É o chamado inventário extrajudicial.
Em agosto de 2024, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deu um passo adiante com a publicação da Resolução nº 571, que trouxe atualizações significativas para esse procedimento, uniformizando entendimentos que até então dependia da interpretação da Justiça de cada estado.
Vamos entender essas mudanças e porque elas são importantes.
- Inventário com Menores ou Incapazes: Antes, se houvesse um herdeiro menor de idade ou incapaz, o inventário tinha que ser feito pela via judicial. Agora, com a nova resolução, é possível realizar o inventário extrajudicialmente mesmo com herdeiros nessa situação, desde que (i) o herdeiro menor receba sua parte em cada bem inventariado, não permitindo a venda ou transferência desses bens para outra pessoa e (b) haja manifestação favorável do Ministério Público.
- Inventário com Testamento: A resolução também uniformiza o entendimento de que inventários com testamento podem ser feitos via extrajudicial. Antes da Resolução, a autorização para inventário extrajudicial nesses casos era baseada em jurisprudência do STJ. Contudo, a possibilidade do inventário extrajudicial quando há testamento não exime a obrigação de promover ação de registro de testamento, na qual o Poder Judiciário avaliará a validade e os termos do testamento, sem entrar no mérito dos assuntos sucessórios e da partilha. Trata-se de uma ação relativamente rápida e sem grandes obstáculos. A sentença de registro de testamento permitirá a feitura do inventário extrajudicial.
- Alienação de Bens do Espólio: Uma mudança prática e significativa é a possibilidade de o inventariante, no curso do inventário extrajudicial, vender bens do espólio para cobrir despesas do inventário sem necessariamente precisar de um alvará judicial. Isso agiliza o processo e ajuda a liquidez do espólio, mas exige garantias de que o dinheiro será usado corretamente. Antes da Resolução, a venda somente poderia ocorrer mediante autorização judicial específica.
Mas você pode se perguntar, mas Bruno qual importância dessa resolução do CNJ e por que ela traz mudanças significativas?
- Descongestionamento do Judiciário: Com esses procedimentos sendo feitos fora dos tribunais, o número de processos judiciais diminui, permitindo que os juízes se dediquem a casos mais complexos ou que realmente necessitem da intervenção judicial.
- Rapidez e Economia: O inventário extrajudicial é mais rápido e, geralmente, menos caro do que o judicial. Isso significa menos tempo de espera para os herdeiros e menos custos com advogados e processos.
- Proteção de Direitos: Mesmo com a simplificação, a resolução garante que os direitos de herdeiros menores ou incapazes sejam protegidos, com a necessidade de aprovação do Ministério Público.
- Flexibilidade: Permite que situações mais complexas, como a existência de um testamento, sejam resolvidas de maneira mais ágil, o que antes poderia atrasar significativamente o processo.
A Resolução nº 571/2024 do CNJ é um avanço significativo na desburocratização dos processos sucessórios no Brasil. Ela reflete uma tendência global de simplificação de procedimentos legais que beneficiam diretamente os cidadãos. Entretanto, essa flexibilização exige que os envolvidos estejam bem-informados e acompanhados por advogado para assegurar que todos os requisitos legais sejam atendidos e os direitos de todos os herdeiros sejam respeitados.
Esse progresso não só facilita a vida dos herdeiros, mas também reforça a necessidade de um bom planejamento sucessório, onde os bens podem ser organizados de maneira a facilitar a transição para os herdeiros, minimizando conflitos e burocracias futuras.
Bruno Lima e Moura de Souza é advogado pós-graduado em direito tributário e integrante do departamento de tax e wealth planning do BLS Advogados em São Paulo.