Por Pedro M. Leite e Luiza Paz da Cunha
A chamada do título sugere a necessidade de atenção à observância da janela de oportunidade constante no cenário atual. Isto, em relação a doação de cotas de uma pessoa jurídica a menor custo, dinâmica não contemplado na Emenda Constitucional n. 132 de 2023, Reforma Tributária.
A temática restringe-se ao planejamento sucessório em que: o detentor do patrimônio, constituí uma pessoa jurídica de responsabilidade limitada (holding patrimonial), após, integraliza o acervo familiar imobilizado por valor de custo – constante em sua Declaração de Imposto de Renda (DIRPF). Ao fim, deseja doar aos seus herdeiros as quotas de tal sociedade de forma a facilitar e adiantar a sucessão.
Vejamos, a base jurídica deste planejamento apoia-se no artigo 23, caput da Lei n. 9.249/95, o qual faculta ao indivíduo integralizar bens e direitos em uma sociedade pelo custo de aquisição. Isso garante que no balanço da sociedade, o ativo, correspondente ao valor de custo dos imóveis reflita o valor do patrimônio líquido – situação aplicável para empresa que não tenha efetiva operação, como locação ou alienação.
Ademais, analisando o cenário do Estado de São Paulo, a Lei Estadual 10.705/00 prevê, em seu artigo 14, § 3º, que, nos casos em que os títulos representativos de capital social não forem negociados em bolsa, o valor de base de cálculo do ITCMD será o valor patrimonial da sociedade, ou seja, o patrimônio líquido.
A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (“SEFAZ”) editou a Resposta à Consulta Tributária n. 24.429/2021 reconhecendo que o único valor patrimonial possível de ser usado como base de cálculo do ITCMD é aquele que se aproxima do valor de mercado das quotas, portanto, mitigando a diferença entre as duas bases utilizadas.
A discussão foi levada ao judiciário, de modo que o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) manifesta entendimento favorável aos contribuintes, adotando como base de cálculo o valor patrimonial contábil das quotas transmitidas, tal qual descrito no balanço da empresa (TJ-SP; Remessa Necessária Cível 1026739-07.2020.8.26.0482, Dje 27/09/2021; Apel. 1018552-78.2018.8.26.0482, Dje 21/06/2021).
A pedra de toque da presente discussão está quando encaramos a possível mudança de base de cálculo trazida pela Reforma Tributária no PLP nº 108/2024, naquilo que tange a doação de participações representativas de capital da sociedade.
O artigo 171, I da Proposta de Lei Complementar citada acima prevê que, na hipótese da doação ou transmissão causa mortis de participações societárias não negociadas em bolsa a base de cálculo deve ser calculada com metodologia tecnicamente idônea e adequada às quotas ou ações. Assim, deverá corresponder, no mínimo, ao patrimônio líquido ajustado pela avaliação de ativos e passivos a valor de mercado, acrescido do valor de mercado do fundo de comércio, conforme estabelecido na legislação do ente tributante.
Considerando as chances significativas de tal proposta ser convertida em Lei Complementar, teríamos, então, um novo cenário, em que a doação das quotas da sociedade, referida no início deste artigo, seria feita com base em um balanço levantado à época da doação, com todo o ativo (que nesse caso é composto exclusivamente por imóveis) reavaliado a valor de mercado.
Tal fato acarretaria um aumento substancial do imposto a ser pago: enquanto no primeiro caso narrado o ativo está marcado a custo, refletindo o valor considerado quando da integralização dos imóveis na empresa, no segundo caso, tal ativo corresponderá ao valor de cada um dos imóveis no mercado quando da época da doação.
Outro ponto relevante é que a Proposta de Lei Complementar não determina qual seria esse valor de mercado a ser utilizado, a ser definido pelas leis estaduais.
Além disso, a EC n. 132/2023 modificou o artigo 155, § 1º da Constituição Federal de 1988 para fazer constar no inciso VI, que o ITCMD deverá ser obrigatoriamente progressivo, considerando que desde 1992, conforme a Resolução nº 09 do Senado Federal, a alíquota máxima no país é 8%.
Assim, todos os Estados que não adotam ainda a progressividade do imposto, deverão modificar suas legislações para comportar a redação dada pela emenda – logo, será vinculativo aos Estados, porta fechada para este coeficiente de economia tributária, não haverá espaço para novas janelas de oportunidade tributária. Ao fim e ao cabo, nos parece ser uma decisão arriscada, além de bastante custosa, já que os projetos de leis em tramitação são cada vez mais antielisivos.
Pedro M. Leite – Pós-graduado em Direito Tributário pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI); MBA em Direito do Agronegócio pelo Centro de Estudos e Negócios (CEDIN). Membro da Comissão Federal de Direito Agrário da OAB/SP. Advogado atuante em Wealth Planning no Chulam Colucci Advogados.
Luiza Paz da Cunha – Pós-graduada em Direito de Família e Sucessões pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP). Advogada atuante em Wealth Planning no Chulam Colucci Advogados.