Por Vanessa Scuro
Depois de aceito o pedido, os noivos começam uma verdadeira maratona de preparativos, envolvendo a cerimônia, a festa, os convidados, o vestido, o bolo e assim por diante. E, paralelamente a isso, também é o momento de tratarem do regime de bens e de outras questões, patrimoniais ou não[1], a serem aplicadas no futuro casamento.
A formalização dessas tratativas se dá por meio da lavratura, prévia ao casamento, do chamado pacto antenupcial.
É nulo o pacto que não for feito por escritura pública, sendo também ineficaz se não lhe seguir o casamento. Da mesma forma, as convenções do pacto não terão efeitos sobre terceiros apenas depois de registradas pelo Oficial do Registro de Imóveis do primeiro domicílio dos cônjuges.
Em regra, os noivos são livres para a escolha do regime de bens que quiserem. Se não houver no pacto manifestação expressa sobre o regime de bens escolhido, ou se for nula ou ineficaz a convenção, o regime de bens será o da comunhão parcial, que é o regime legal brasileiro.
Essa liberdade é ampla e possibilita a escolha, não só de um dos regimes regulados por lei (comunhão universal de bens, separação convencional de bens e participação final de aquestos), mas também de um regime criado pelos próprios cônjuges, com regras próprias (ou resultantes da combinação de vários regimes legais), desde que o regramento não contenha cláusulas contrárias à lei, à moral e aos bons costumes.
A exceção a essa regra se encontra na imposição do regime obrigatório de separação de bens às seguintes pessoas: (i) ao viúvo ou viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros; (ii) à viúva ou à mulher, cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez ou da dissolução da sociedade conjugal; (iii) ao divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal; (iv) ao tutor ou curador e seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas; (v) aos maiores de setenta anos; (vi) a todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
O regime de bens começa a vigorar na data do casamento e cessa com a dissolução da sociedade conjugal, por morte, nulidade ou anulação do casamento, separação (judicial ou de fato) ou divórcio.
O Código Civil admite a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial, que só será concedida se houver pedido motivado de ambos os cônjuges, apurando-se a procedência das razões invocadas, com ressalva dos direitos de terceiros.
Além do regime de bens, no pacto antenupcial poderão ser estipuladas disposições de caráter patrimonial para aplicação no futuro casamento, as quais, em geral, têm o propósito de prevenir a ocorrência de conflitos durante o casamento ou em sua dissolução.
Nesse sentido, o pacto pode estabelecer, por exemplo: (i) critérios para aquisição, administração e partilha do acervo patrimonial da família; (ii) o valor de compensação financeira para aquele cônjuge que, por mútuo consenso, afastar-se do mercado de trabalho em prol do trabalho do outro (transferência de local de trabalho) ou da criação dos filhos comuns; (iii) a criação de um fundo financeiro para emergências; (v) regras sobre a divisão de dívidas, quando contraídas por apenas um dos cônjuges; (vi) critérios e limites para auxílio financeiro a familiares; (viii) o direito ao uso gratuito do imóvel residencial do casal, em favor de determinado cônjuge, para o caso de dissolução do casamento, independentemente do imóvel ser de propriedade comum do casal ou particular do outro.
E, considerando a possibilidade de o pacto não ser restrito a cláusulas de cunho patrimonial, também podem nele ser pactuadas disposições relativas, dentre outras: (i) à convivência pessoal dos futuros cônjuges, à rotina e aos deveres domésticos de cada um, (ii) ao relacionamento com as respectivas famílias de origem (frequência de visitas, alternância de datas comemorativas etc.), (iii) à educação e orientação, inclusive religiosa, dos filhos, (iv) a nomeação de tutor os filhos.
A experiência mostra que todos os exemplos acima citados são situações de potencial litígio entre o casal, na constância da vida em comum ou quando de sua dissolução.
E, como cada casal tem suas particularidades, o ideal é que os noivos aproveitem a oportunidade para dialogar, acompanhados por seus advogados, a respeito de questões que podem impactar a harmonia e perenidade do futuro casamento, formalizando-as via pacto antenupcial.
[1] Há controvérsia na doutrina a respeito da possibilidade de o pacto também tratar de questões não patrimoniais, porém, em nosso sentir, considerando não haver vedação legal, tais disposições são possíveis, observados os limites legais.
Vanessa Scuro é advogada especialista em Direito de Família e das Sucessões, pós-graduada em Direito Notarial e Registrário Imobiliário, e sócia do Dias Carneiro Advogados, em São Paulo, em São Paulo.