A troca internacional de informações financeiras já é uma realidade e autoridades fiscais de mais de 100 países recebem ou receberão informações sobre ativos financeiros mantidos mundo afora por seus contribuintes. O que pouco se divulga é que, para empresas offshore, informações prestadas inadequadamente podem resultar em multas pesadas contra essas empresas e seus diretores. É o que veremos a seguir.
O Common Reporting Standards (CRS) é um conjunto de regras estabelecidas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que visa a troca automática de informação tributária e financeira entre as autoridades fiscais de praticamente todo o mundo. Essa troca automática de informação se materializa por meio de relatórios financeiros denominados CRS Reports.
De uma maneira muito resumida, com a implementação do CRS, todos os países participantes devem fornecer informações financeiras e tributárias com relação a todas as pessoas (físicas ou jurídicas) que utilizam o seu sistema bancário ou jurídico e que sejam residentes fiscais em um outro país.
Desta forma, se um residente fiscal brasileiro mantiver uma conta ou investimentos num banco suíço, esse banco enviará certas informações sobre essa conta à autoridade fiscal suíça que, por sua vez, fornecerá as mesmas informações à Receita Federal brasileira.
Quando o residente fiscal brasileiro for detentor de uma empresa (ex., offshore) e esta mantiver uma conta ou investimentos num banco suíço, o fluxo de informação fica mais complicado pois, em primeiro lugar, a empresa offshore deverá ser classificada segundo as regras de CRS.
Não trataremos aqui sobre as diversas classificações possíveis que uma empresa ou estrutura jurídica pode ter, mas é importante frisar que a classificação da empresa para fins de CRS é de suma importância, pois define:
- quem terá a responsabilidade de colher as informações necessárias e de prepara o CRS Report;
- quem serão os envolvidos no fluxo das informações; e
- que tipo de informação será fornecida.
A falta de envio das informações, o seu envio incompleto, com erros ou atrasado acarreta consequências financeiras na forma de multas.
Portanto, dependendo da classificação CRS da empresa estrangeira da qual o residente brasileiro é acionista, pode ser que o próprio banco suíço prepare o relatório à autoridade fiscal suíça e essa forneça o relatório ao fisco do país da offshore para que, então, tal país finalmente envie o relatório à Receita Federal.
Ou, pode ser que o banco já não tenha a obrigação de preparar o relatório e que essa obrigação seja da própria offshore, na pessoa de seu diretor. Nesse caso, o diretor deverá preparar e fornecer o CRS Report à autoridade fiscal do país da offshore que, por sua vez, fornecerá essa informação ao fisco brasileiro.
Assim, tem-se que a classificação de uma empresa para fins de CRS é essencial para determinar quem tem a obrigação de preparar e fornecer o CRS Report.
Para ilustrar as consequências de maneira simplificada, quando um banco tem a obrigação de preparar o CRS Report, as informações financeiras a serem fornecidas são apenas aquelas que o banco possui, ou seja, aquelas decorrentes daquele relacionamento bancário específico com cliente.
No entanto, quando é o diretor da empresa quem tem a obrigação de preparar o CRS Report, as informações reportadas são mais amplas e se referem à situação financeira da empresa como um todo e não somente de uma relação bancária.
Ainda que a empresa mantenha somente uma conta bancária, o simples fato de o banco precisar incluir no seu relatório saldo e a diretoria da empresa o patrimônio líquido, faz com que os números fornecidos no CRS Report sejam diferentes (ainda que minimamente).
Quem tem a obrigação de classificar uma empresa sob as regras de CRS é a diretoria da empresa. No entanto, quando não há um diretor profissional ou o aconselhamento jurídico adequado para a classificação CRS, o acionista da empresa (que muitas vezes também atua como diretor) acaba errando na classificação por falta de conhecimento técnico.
Quando a classificação CRS é feita de forma equivocada e o banco é quem deve enviar o CRS Report (também equivocado), não há uma consequência jurídica para o banco, pois esse simplesmente cumpriu com a sua obrigação segundo as informações fornecida pelo diretor da empresa (que assinou o formulário bancário de CRS com a classificação equivocada).
O diretor da empresa, no entanto, poderá ser questionado quanto à veracidade das informações prestadas e a empresa, então, poderá sofrer consequências adversas.
As jurisdições começaram a fiscalizar o cumprimento das regras de CRS, exigindo a ata de diretoria que demostre como foi feita a classificação das empresas.
Além disso, dependendo da classificação CRS adotada e da jurisdição onde se encontra, a empresa deve adotar um manual de procedimentos internos para fins de reporte de CRS.
Nas Ilhas Virgens Britânicas, por exemplo, a lei local estabelece a obrigatoriedade de tal manual de procedimentos e a sua falta pode resultar em multa de até USD 100.000. Em Bahamas, que também possui exigência similar, o valor da multa pode chegar a USD 300.000.
A classificação CRS, bem como as demais obrigações que decorrem dessa classificação, não são óbvias ou fáceis. O tema “CRS”, para muitos, não é nada interessante e, por vezes, nem mesmo é do conhecimento do acionista, mas o cumprimento das regras de CRS é tão essencial como qualquer outra obrigatoriedade fiscal ou regulatória.
É essencial que aqueles que mantenham empresas offshore revisem a classificação CRS já adotada a fim de evitar a aplicação de multas. Para aqueles que pretendem abrir uma offshore, a recomendação é que não menosprezem a correta classificação CRS.
Jacyrandi Steinmann é advogada especialista em planejamento patrimonial e sucessório internacional e sócia da Brainvest Trust Services, com sede em Zurique, Suíça.
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frequência, para mais artigos como estes. Obrigado. 🙂