Por Felipe Louzada
A venda de um imóvel para a quitação de financiamento de outro imóvel não é uma prática incomum. Até recentemente, o lucro apurado com essa alienação era considerado pela Receita Federal como ganho de capital sujeito à tributação pelo imposto de renda (IR). Mas isso não é mais assim.
Em março de 2022, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa RFB nº 2.070/2022, que alterou outro normativo (Instrução Normativa SRF nº 599/2005) que tratava da tributação do ganho de capital por pessoa física.
A IN nº 2.070/2022 passou a prever a isenção do IR sobre o ganho de capital auferido por pessoa física residente no país nas operações relacionadas à venda de imóvel residencial que tenham como objetivo quitar, total ou parcialmente, débito remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel residencial já possuído pelo alienante.
Em outras palavras, o ganho de capital (diferença positiva entre o valor de compra e o de venda) apurado por pessoa na alienação de imóvel residencial, e que seja utilizado para quitar débito relacionado à compra de outro imóvel adquirido anteriormente à essa venda, se beneficia de isenção de IR. Vale mencionar que, atualmente, a alíquota de IR sobre ganho de capital é progressiva, podendo variar entre 15 e 22,5%.
Embora tenha sido divulgada como uma ampliação das hipóteses de isenção do ganho de capital na alienação de imóveis, o novo normativo apenas reconheceu um direito do contribuinte, corrigindo o entendimento anterior equivocado que a Receita Federal exprimia na Instrução Normativa SRF nº 599/2005.
A Receita Federal se valia da redação do Art. 2º, § 11º, da IN SRF nº 599/2005, que dispunha sobre a não aplicabilidade da isenção na hipótese de venda de imóvel residencial com o objetivo de quitar, total ou parcialmente, débito remanescente de aquisição a prazo ou à prestação de imóvel residencial já possuído pelo alienante, para questionar os contribuintes e lançar o imposto de renda sobre essas operações.
Ocorre que o Art. 39, da Lei nº 11.196/2005, que trata sobre ganho de capital na alienação de imóveis, não menciona qualquer dispositivo que impeça o contribuinte de usufruir do benefício da isenção concedido pela Lei.
Com a extensa busca dos contribuintes por justiça, o STJ decidiu no REsp nº 1.668.268/SP que a restrição imposta pelo Art. 2º, § 11, da IN SRF nº 599/2005 era ilegal.
O brilhante voto da Relatora Ministra Regina Helena Costa certifica que “a lei nada dispõe acerca de primazias cronológicas na celebração dos negócios jurídicos, muito menos exclui, da hipótese isentiva, a quitação ou amortização de financiamento, desde que observado o prazo de 180 dias e recolhido o imposto sobre a renda proporcionalmente ao valor não utilizado na aquisição”.
Ora, se a Lei não dispõe sobre o tema, é possível afirmar categoricamente que a Instrução Normativa RFB n° 2.077/2022 não inovou ou ampliou o alcance da isenção sobre o ganho de capital obtido na alienação de imóvel. Trata-se, apenas, do reconhecimento de um direito que já era garantido por lei aos contribuintes.
Embora não configure nenhuma inovação, é preciso reconhecer que a publicação do novo instrumento normativo é um ponto positivo para a Receita Federal, uma vez que o contencioso sobre o tema será reduzido a zero e é colocado um ponto final na insegurança jurídica criada por instrução normativa anterior.
Felipe Pereira Louzada é advogado tributarista, associado sênior do BLS Advogados em São Paulo, e coautor do livro Renda Variável e do e-book Saída Definitiva do País – Guia Prática das Obrigações Tributárias, publicados pela Editora B18.
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