A decisão de comprar um carro não é tomada exclusivamente pela necessidade de se locomover. Ela é tomada por uma mistura de necessidades, desejos e emoções.
Consideremos, por exemplo, a escolha entre um carro popular e uma Porsche. Enquanto a primeira opção atende às necessidades básicas de transporte de forma eficiente e econômica, uma Porsche vai além de uma ferramenta de locomoção e é um objeto de desejo. Quem tem, sabe que um carro de luxo proporciona prazer ao dirigir, sinaliza status e prosperidade e traz um sentimento de realização.
Trazendo a analogia para o mundo dos investimentos, as decisões não se baseiam apenas em análises práticas de risco, retorno e liquidez. Essa é a perspetiva trazida pelas finanças comportamentais, difundida por pesquisadores como Meir Statman, Daniel Kahneman e outros. Eles observaram que pessoas não buscam apenas maximizar o seu patrimônio financeiro. Ao investir, pessoas e, até mesmo investidores institucionais como fundos de pensão, querem alcançar outros objetivos além das suas metas financeiras.
Um exemplo clássico disso são fundos temáticos, como os fundos ESG (ambiental, social e governança) ou fundos alinhados com valores religiosos que oferecem aos investidores a chance de alinhar seus investimentos com seus valores pessoais. Mesmo que isso possa significar um retorno financeiro menor ou um risco maior.
Aos portadores de grandes patrimônios, são oferecidos investimentos exlusivos como fundos de Private Equity (PE). Apesar de haver estudos nos Estados Unidos que colocam em dúvida a capacidade dos fundos de PE de superarem, na média, os retornos das ações negociadas em bolsa, eles mantêm sua popularidade como investimento. Em partes, isso pode ser explicado pela crença em resultados superiores. Mas, ao mesmo tempo, os fundos de PE apresentam outras características que tornam a classe interessante do ponto de vista das finanças comportamentais.
O benefício mais atrativo é a baixa volatilidade. Comparado com os seus pares nos mercados públicos, fundos de PE aparentam apresentar muito menos risco. Como esses fundos investem em empresas fechadas e/ou investimentos ilíquidos, suas cotas não são sujeitas às variações do mercado. Os fundos avaliam periodicamente os seus investimentos ao valor justo, que costuma ser muito mais estável do que o preço de mercado. A frequência da avaliação costuma ser trimestral e, em alguns casos, até mesmo anual, sendo um forte contraste em relação às oscilações diárias das ações listadas na bolsa. Porém, tudo isso não significa que o risco é menor. Somente é invisível para o investidor. Na média, o ponto de destino (retorno) não se difere do que é possível alcançar nos mercados públicos. No entanto, como é o caso com a Porsche, a jornada é mais confortável.
O segundo benefício não é mensurável, mas é implícito. Comparável com a compra de uma Porsche, o investimento em PE traz a sensação de exclusividade. Afinal, além das restrições regulatórias para o público geral, os fundos costumam ter investimentos mínimos altos. A restrição de acesso a pessoas com patrimônio elevado, solidifica para o quem investe sua identidade como pessoa próspera e bem-sucedida
Ao final, cabe ao consultor ou assessor educar o cliente e propor o que faz sentido para a uma carteira e para o planejamento financeiro do ponto racional. No entanto, é importante ter empatia com os desejos e benefícios que os investimentos podem propor além de risco e retorno.
Daniel Andreas Frey é graduado em administração e é agente autônomo de investimentos credenciado à XP Investimentos e sócio da Método Investimentos, em São Paulo/SP.