Por David Roberto R. Soares da Silva
No último dia 2 de dezembro, o governado do Paraná Carlos Roberto Massa Junior apresentou o Projeto de Lei 730 à Assembleia Legislativa do estado que propõe diversas mudanças na legislação tributária estadual, incluindo alterações significativas no Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD).
Sobre o ITCMD, uma das alterações mais significativas diz respeito à incidência do imposto sobre bens imóveis e seus respectivos direitos. O imposto passa a ser devido sobre bens imóveis situados no Paraná, mesmo que o de cujus ou o doador tenha domicílio no exterior. Em linha com o que foi estabelecido pela Emenda Constitucional nº 132/2023, esta mudança amplia o alcance do ITCMD ao incluir transmissões de propriedades localizadas no estado, independentemente do domicílio do transmitente.
O projeto também inova ao estabelecer a incidência do ITCMD sobre bens imóveis situados no exterior, em duas situações específicas:
- Quando o de cujus ou o doador tiver domicílio no Paraná.
- Quando o de cujus ou o doador residir no exterior, mas o sucessor, legatário ou donatário tiver domicílio no Paraná.
O projeto também modifica as regras de incidência do ITCMD sobre bens móveis, títulos, créditos e outros bens incorpóreos. Neste caso, o ITCMD também será devido nas seguintes situações:
- Quando o de cujus ou o doador tiver domicílio no Paraná, independentemente da localização dos bens.
- Quando o sucessor, legatário ou donatário tiver domicílio no Paraná, caso o de cujus ou o doador tenha domicílio no exterior.
Uma nova regra é introduzida para casos em que tanto o transmitente quanto o beneficiário estão domiciliados no exterior. Nessa situação, o ITCMD será devido quando o bem estiver localizado no Paraná. Aqui, no entanto, vale ressaltar que o projeto vai além do que autoriza a Emenda Constitucional nº 132. Com exceção dos bens imóveis, o Art. 16 da Emenda não autoriza a incidência do ITCMD quando tanto o doador/de cujus e o donatário, sucessor ou legatário sejam domiciliados no exterior, ainda que um bem móvel (quotas de empresas, por exemplo) estejam situados no Brasil. Trata-se de um caso de não incidência que o projeto de lei paranaense parece ignorar.
O Projeto de Lei 730 também propõe diversas alterações nas isenções do ITCMD, tanto para transmissões causa mortis quanto para doações.
A isenção para um imóvel urbano destinado à moradia do cônjuge sobrevivente, herdeiro ou sucessor é mantida, mas com ajustes. O valor máximo do imóvel para isenção é aumentado para 2.600 UPF/PR (Unidades Padrão Fiscal do Estado do Paraná), cerca de R$ 361 mil.
A isenção para valores não recebidos em vida pelo titular, como remunerações e rendimentos de aposentadoria, é mantida, mas com um limite aumentado para 500 UPF/PR (R$ 69.475).
Também foi mantida a isenção para um imóvel rural, mas com aumento do valor máximo para a isenção. O limite de área permanece o mesmo em 25 hectares, mas o valor máximo é aumentado para 7.500 UPF/PR (R$ 1.042.125).
Uma nova isenção é introduzida para transmissões cuja base de cálculo não ultrapasse 500 UPF/PR (R$ 69.475) por herdeiro ou sucessor.
Também é mantida a isenção para doações destinadas à aquisição de veículo por pessoa com deficiência, com uma expansão do conceito de deficiência para incluir síndrome de Down e autismo. Esta mudança alinha a legislação do ITCMD com políticas de inclusão mais abrangentes.
O projeto ainda introduz novas isenções para doações, incluindo:
- Excesso de meação ou quinhão até 500 UPF/PR.
- Doações de bens móveis ou direitos até 500 UPF/PR por donatário e por exercício civil (ano calendário).
Uma das mudanças mais significativas propostas pelo Projeto de Lei 730 é a reestruturação das alíquotas do ITCMD. O novo sistema propõe uma estrutura progressiva mais detalhada, com quatro faixas de alíquotas:
- 2% para base de cálculo até 1.000 UPF/PR (R$ 138.950)
- 4% para a parcela que exceder 1.000 UPF/PR até 5.000 UPF/PR (R$ 694.750)
- 6% para a parcela que exceder 5.000 UPF/PR até 35.000 UPF/PR (R$ 4.863.250)
- 8% para a parcela que exceder 35.000 UPF/PR
Esta nova estrutura de alíquotas visa tornar o ITCMD progressivo, em linha com a Emenda Constitucional nº 132/2023. O projeto especifica que o imposto a ser recolhido resultará da adição dos valores apurados em cada faixa. Isso significa que o cálculo será feito de forma similar ao imposto de renda, onde cada parcela da base de cálculo é tributada de acordo com sua respectiva alíquota.
O projeto também estabelece que a alíquota do imposto será a vigente ao tempo da ocorrência do fato gerador, garantindo segurança jurídica, e evitando aplicação retroativa de novas alíquotas.
O projeto ainda estabelece que, em casos de sobrepartilha que impliquem mudança de faixa de alíquotas, será cobrada a diferença do imposto, com os acréscimos legais. Isso evita que a partilha seja usada como mecanismo para reduzir artificialmente a carga tributária.
O Projeto de Lei 730 também propõe alterações nos procedimentos administrativos relacionados ao ITCMD, visando maior eficiência e clareza no processo de declaração e pagamento do imposto.
Uma importante inovação é a introdução de um mecanismo para declarações antecipadas. Quando a declaração for apresentada antes do prazo de vencimento do imposto, e os valores declarados se submeterem à análise administrativa, o contribuinte poderá realizar o pagamento do tributo sem incidência de multa ou juros de mora, caso não haja deliberação no prazo estabelecido pela Secretaria de Estado da Fazenda. Esta medida pode incentivar declarações antecipadas e proporcionar maior segurança jurídica aos contribuintes, evitando penalidades por atrasos não atribuíveis ao declarante.
Por fim, de acordo com o Art. 54 do Projeto de Lei 730, as disposições sobre o ITCMD entrarão em vigor em duas datas diferentes, caso o projeto seja aprovado:
- A partir de 21 de dezembro de 2023, com relação à incidência do imposto, independentemente da localização dos bens, quando o de cujus ou o doador tiver domicílio no Paraná; e
- A partir de 1° de maio de 2025, com relação a todas as demais alterações relacionadas ao ITCMD, incluindo mudanças nas alíquotas, isenções, e procedimentos administrativos.
Se aprovado o projeto, contribuintes paranaenses contarão com cerca de quatro meses para implementar planejamentos patrimoniais e sucessórios usufruindo da alíquota de 4%, atualmente em vigor.
David Roberto R. Soares da Silva é advogado tributarista especializado em planejamento patrimonial e sucessório, sócio do BLS Advogados, e autor de Tributação das aplicações financeiras, empresas offshore e trusts no exterior (2024), Construindo o Planejamento Patrimonial e Sucessório: Análise de casos reais (2023), do Brazil Tax Guide for Foreigners (2010-2021), e coautor do Planejamento Patrimonial: Família, Sucessão e Impostos (2022), Renda Variável (2021) e Tributação da Economia Digital no Brasil (2020), todos publicados pela Editora B18.