Questão recorrente àqueles que escolhem a via extrajudicial para realizar inventário é a aplicação de multa sobre o valor do ITCMD devido quando a escritura de inventário não é lavrada no prazo de 60 dias depois do falecimento. Um projeto de lei paulista pretende adequar esse prazo ao inventário extrajudicial, trazendo mais segurança aos inventariantes e herdeiros.
No estado de São Paulo, o art. 21, inciso I da Lei nº 10.705/2000 determina que “no inventário e arrolamento que não for requerido dentro do prazo de 60 dias da abertura da sucessão, o imposto será calculado com acréscimo de multa equivalente a 10% do valor do imposto; se o atraso exceder a 180 dias, a multa será de 20%”. Essa lei foi promulgada no ano 2000, época em que somente era possível o inventário judicial. Naquele contexto, bastava iniciar o processo de inventário com a petição de primeiras declarações no prazo de 60 dias do falecimento para não se ver aplicada a multa sobre o ITCMD devido.
A partir de 2007, a Lei nº 11.441/2007 passou a permitir o inventário extrajudicial por meio de escritura pública, em cartório, sem a necessidade de processo judicial. Isso tornou o procedimento mais rápido e mais barato: enquanto um inventário judicial pode levar anos para ser concluído, o extrajudicial pode ser feito em poucos meses, sem a necessidade de pagamento de custas judiciais que podem chegar a 1% do valor do patrimônio. O inventário extrajudicial é requerido perante o cartório de notas e o seu resultado é uma escritura pública. Atualmente, a lei impõe algumas condições ao inventário extrajudicial, como a inexistência de herdeiros menores ou incapazes e a concordância dos herdeiros com relação à partilha dos bens.
No entanto, diferentemente do processo judicial de inventário, no qual os documentos podem ser juntados no curso do processo, no procedimento extrajudicial, a escritura de partilha de bens somente poderá ser lavrada após a devida nomeação de inventariante (também por escritura) e apresentação dos documentos pertinentes aos bens sujeitos ao inventário. Enquanto não apresentados tais documentos, a única escritura possível de ser lavrada no âmbito extrajudicial é a de abertura de inventário e nomeação de inventariante.
Ocorre que a lei paulista não prevê qualquer exceção para a exoneração da multa por atraso, mesmo que a escritura de nomeação de inventariante seja lavrada dentro dos 60 dias contados a partir do óbito (abertura da sucessão). Para o fisco paulista, é a própria escritura pública de inventário e partilha que deve ser lavrada nesse prazo, depois do qual a multa passa a ser devida. No entanto, são raros os casos em que o levantamento e apresentação desses documentos conseguem ser finalizados em 60 dias, permitindo a lavratura da escritura final. Isso acaba por fazer com que muitos procedimentos extrajudiciais de inventário no estado de São Paulo estejam sujeitos à multa por atraso.
Em 2016, a Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo publicou o Provimento CGJ nº 55/2016 estabelecendo que o termo inicial do procedimento de inventário extrajudicial é a escritura de nomeação do inventariante e não a data do óbito. No entanto, o fisco paulista não reconhece essa possibilidade, exigindo que herdeiros recorram ao Poder Judiciário para afastar a penalidade. Já há vários julgados aceitando a aplicação do Provimento CGJ nº 55/2016.
Com o objetivo de regular em lei essa matéria, tramita na Assembleia Legislativa paulista o Projeto de Lei nº 991/2019, do deputado Sergio Vitor, que pretende inserir dispositivo expresso na Lei nº 10.705/2021 para fazer constar expressamente o que dispõe o Provimento CGJ nº 55/2016: o de que o prazo de 60 dias para a aplicação da multa por atraso na conclusão do inventário extrajudicial será iniciado a partir da data da lavratura da escritura de abertura de inventário e nomeação do inventariante e não mais do óbito, garantindo mais prazo aos herdeiros coletarem todos os documentos e informações necessários à escritura de inventário e partilha.
No final de outubro de 2021, o projeto recebeu parecer favorável e aguarda a sua inclusão em pauta para ser votado pela Assembleia paulista. Com um pouco de sorte e empenho, em breve os herdeiros paulistas não mais precisarão recorrer ao Poder Judiciário para afastar a aplicação da multa de até 20% sobre o ITCMD devido, desde que o inventário seja finalizado em até 60% da nomeação do inventariante. Certamente, isso poderá trazer mais tranquilidade a todos.
Ricardo Almeida Blanco é advogado especialista em planejamento patrimonial e sucessório e associado sênior do Battella, Lasmar & Silva Advogados, em São Paulo.
QUER MAIS SOBRE INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL COM O NOSSO BEST SELLER “PLANEJAMENTO PATRIMONIAL“: