Por Roberto Prado de Vasconcellos
Considerando a complexidade do sistema tributário brasileiro, as expectativas sobre uma possível e substancial reforma tributária no país são constantemente renovadas, mas pouco de concreto tem sido feito. Por outro lado, na ânsia de aumentar a arrecadação, tem-se procurado soluções que não envolvam conflitos que afetem as receitas de estados e municípios e, neste sentido, o retorno da tributação dos dividendos ganha força.
Dois são os principais projetos de lei (PL) sobre o tema, os quais são analisados neste artigo.
O PL nº 2015/2019, de autoria do Senador Otto Alencar (PSD/BA) e atualmente em tramitação no Senado Federal, pretender instituir imposto de renda retido na fonte (IRRF) à alíquota única de 15% sobre os dividendos distribuídos a pessoas físicas e jurídicas. A tributação deve incidir independentemente de as pessoas jurídicas que os distribuem estarem sob o regime do lucro real, presumido ou arbitrado. No caso de sócios domiciliados no exterior, os dividendos estarão sujeitos ao IRRF à mesma alíquota de 15%, exceto no caso daqueles domiciliados em país ou dependência de tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado, cuja alíquota aplicável será de 25%.
O PL nº 2015/2019 prevê que a retenção do imposto na fonte será considerada, no caso de beneficiário pessoa física, mera antecipação do imposto devido na Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda. No caso das pessoas jurídicas sujeitas ao regime do lucro real, o valor retido será compensável com o IRPJ a recolher. Nos demais casos, o PL propõe que a tributação seja definitiva.
Desde 13 de março de 2020, o PL nº 2015/2019 já foi debatido em audiência pública e está em fase de análise com a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal.
Outro projeto de lei sobre o tema, também no Senado Federal, é o PL nº 1952/2019, de autoria do Senador Eduardo Braga (MDB/AM). Este projeto, no entanto, não se limita apenas a propor o restabelecimento da tributação de dividendos na forma de IRRF, mas pretende eliminar a dedução legal dos juros sobre capital próprio, situação esta que certamente aumentaria a carga tributária das grandes empresas tributadas sob o Lucro Real.
O PL ainda propõe o fim da isenção tributária sobre rendimentos de determinados ativos financeiros detidos por pessoas físicas, e a unificação a tabela progressiva de IR das pessoas físicas por uma alíquota única de 27,5%.
Como o PL nº 2015/2019, o PL nº 1952/2019 propõe alíquota única de IRRF de 15% para beneficiários pessoa física e jurídica, residentes no Brasil ou no exterior, salvo no caso de dividendos distribuídos a residentes ou domiciliados em país ou dependência com tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado, hipótese em que a alíquota proposta é 25%.
Ainda pelo PL nº 1952/2019, para pessoa jurídica beneficiária tributada como base no lucro real, o imposto será considerado mera antecipação do devido, admitida a compensação com o imposto retido por ocasião do pagamento ou crédito de lucros ou dividendos a seu titular, sócios ou acionistas. Em todos os demais casos, a tributação será considerada definitiva.
No caso de beneficiário pessoa física, o PL propõe que o contribuinte poderá optar, a seu critério, pelo tratamento tributário do IRRF sobre dividendos: ou tributação definitiva de 15%, tal como ocorre atualmente com os rendimentos de aplicações financeiras, ou como antecipação, passando os dividendos a integrarem a base de cálculo do IR devido na Declaração de Ajuste Anual. Neste último caso, os dividendos poderão sofrer tributação adicional pois, ao integrarem a base de cálculo do IR anual, estarão sujeitos às alíquotas progressivas (tabela progressiva de até 27,5%). Por outro lado, se a carga tributária do contribuinte, depois de adicionar os dividendos, for inferior a 15%, o excedente retido sobre os dividendos dará direito à restituição.
Em contrapartida à recriação da tributação dos dividendos, o PL nº 1952/2019 propõe a redução da alíquota-base do IRPJ de 15% para 12,5% e do adicional de 10% para 7,5%.
Assim como o PL nº 2015/2019, o PL nº 1952/2019, desde 10 de março de 2020, está com a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal para análise e discussões. Se qualquer um dos projetos for aprovado pelas duas Casas Legislativas até o final do ano, a lei deles decorrente somente poderá valer a partir de 2021. A questão que se coloca é que, em razão de limitações constitucionais, a nova tributação sobre dividendos somente poderia atingir os dividendos pagos a partir de lucros apurados após a edição da lei. Se pretender tributar dividendos distribuídos a partir de lucros gerados antes da lei, certamente haverá longas disputas judiciais, que poderão frustrar os objetivos de arrecadação.
Roberto Prado de Vasconcellos é advogado sênior especialista em tributação internacional, e coautor do livro Planejamento Patrimonial: Família, Sucessão e Impostos, publicado pela Editora B18.