Por David Roberto R. Soares da Silva<\/strong><\/a><\/p> Sempre se ouve falar do b\u00f4nus da uni\u00e3o est\u00e1vel, que incluiria o direito \u00e0 partilha de bens em caso de dissolu\u00e7\u00e3o ou direito \u00e0 heran\u00e7a de companheiro falecido. Mas pouco se fala do \u00f4nus…<\/p> Pois bem, h\u00e1 pouco mais de um m\u00eas, o Superior Tribunal de Justi\u00e7a decidiu que um bem de uma pessoa em uni\u00e3o est\u00e1vel pode vir a responder por d\u00edvida tribut\u00e1ria do outro companheiro.<\/p> Trata-se de uma decis\u00e3o peculiar que, sem d\u00favida, chama a aten\u00e7\u00e3o e mostra que o b\u00f4nus da uni\u00e3o est\u00e1vel n\u00e3o est\u00e1 livre do \u00f4nus.<\/p> O caso se referia ao arrolamento de bens de uma mulher para garantir d\u00edvida tribut\u00e1ria em nome de seu companheiro, com o qual vivia em uni\u00e3o est\u00e1vel.<\/p> O arrolamento de bens est\u00e1 previsto na Lei n\u00ba 9.532\/1997, cujo art. 64 disp\u00f5e o seguinte:<\/p> “Art. 64. A autoridade fiscal competente proceder\u00e1 ao arrolamento de bens e direitos do sujeito passivo sempre que o valor dos cr\u00e9ditos tribut\u00e1rios de sua responsabilidade for superior a trinta por cento do seu patrim\u00f4nio conhecido.<\/em><\/p> \u00a7 1\u00ba Se o cr\u00e9dito tribut\u00e1rio for formalizado contra pessoa f\u00edsica, no arrolamento devem ser identificados, inclusive, os bens e direitos em nome do c\u00f4njuge<\/strong>, n\u00e3o gravados com a cl\u00e1usula de incomunicabilidade.<\/em><\/p> (….)<\/em><\/p> \u00a7 7\u00ba O disposto neste artigo s\u00f3 se aplica a soma de cr\u00e9ditos de valor superior a R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais);<\/em><\/p> Ou seja, a lei que trata do arrolamento faz refer\u00eancia expressa aos bens de c\u00f4njuge<\/strong>, silenciando quanto aos bens de companheiro<\/strong> que vive em uni\u00e3o est\u00e1vel com o devedor. Por causa disso, a companheira ingressou com medida judicial questionando a equipara\u00e7\u00e3o de bens de companheiro a bens de c\u00f4njuge, como determina a lei.<\/p> Ao analisar a quest\u00e3o, o Tribunal de Justi\u00e7a de Santa Catarina julgou favoravelmente \u00e0 companheiro, rejeitando a equipara\u00e7\u00e3o de companheiro a c\u00f4njuge para fins tribut\u00e1rios, mais especificamente, para fins de arrolamento fiscal.<\/p> Levado o caso ao STJ, o tribunal entendeu que a equipara\u00e7\u00e3o de companheiro a c\u00f4njuge encontra respaldo na pr\u00f3pria Constitui\u00e7\u00e3o Federal e que, portanto, carrega consigo tanto o b\u00f4nus quanto o \u00f4nus, podendo os bens da companheira serem arrolados para fins de garantir d\u00edvida tribut\u00e1ria do outro companheiro.<\/p> Abaixo os trechos relevantes da decis\u00e3o:<\/p> TRIBUT\u00c1RIO. ARROLAMENTO DE BENS. UNI\u00c3O EST\u00c1VEL. BENS E DIREITOS EM NOME DO COMPANHEIRO (CONVIVENTE). EQUIPARA\u00c7\u00c3O \u00c0 FIGURA DO C\u00d4NJUGE. POSSIBILIDADE.<\/em><\/p> (…) 2. Mandado de seguran\u00e7a impetrado contra ato que estendeu \u00e0 figura da convivente\/companheira (uni\u00e3o est\u00e1vel) a determina\u00e7\u00e3o de que, na hip\u00f3tese de formaliza\u00e7\u00e3o de cr\u00e9dito tribut\u00e1rio contra pessoa f\u00edsica, o arrolamento deve identificar, inclusive, os bens e direitos (n\u00e3o gravados com a cl\u00e1usula de incomunicabilidade) do c\u00f4njuge.<\/em><\/p> 3. O art. 226, \u00a7 3\u00ba, da Constitui\u00e7\u00e3o Federal determina que para efeito da prote\u00e7\u00e3o do Estado, \u00e9 reconhecida a uni\u00e3o est\u00e1vel entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua convers\u00e3o em casamento.<\/em><\/p> 4. \u201cA uni\u00e3o est\u00e1vel, assim como o casamento, produz efeitos jur\u00eddicos t\u00edpicos de uma entidade familiar: efeitos pessoais entre os companheiros, dentre os quais se inclui o estabelecimento de v\u00ednculo de parentesco por afinidade, e efeitos patrimoniais que interessam n\u00e3o s\u00f3 aos conviventes, mas aos seus herdeiros e a terceiros com os quais mantenham rela\u00e7\u00e3o jur\u00eddica\u201d.(REsp 1516599\/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21\/09\/2017, DJe 02\/10\/2017).<\/em><\/p> 5. A din\u00e2mica da realidade social exige do int\u00e9rprete da norma a constante adequa\u00e7\u00e3o entre o texto da lei e a realidade dos fatos para garantir que as rela\u00e7\u00f5es jur\u00eddicas originadas ou decorrentes da uni\u00e3o est\u00e1vel produzam resultados iguais ou semelhantes \u00e0s situa\u00e7\u00f5es an\u00e1logas derivadas do casamento<\/strong>.<\/em><\/p> 6. N\u00e3o se pode, por outro lado, vislumbrar a equipara\u00e7\u00e3o entre c\u00f4njuge e companheiro apenas na seara dos direitos, mas tamb\u00e9m na dos deveres, sob pena de ganhar for\u00e7a a tese de que ao primeiro (o c\u00f4njuge) restri\u00e7\u00f5es s\u00e3o impostas e ao segundo (o companheiro) isso n\u00e3o acontece, quando deveria ocorrer (se ele \u00e9 equiparado \u00e0quele no tocante aos direitos)<\/strong>.<\/em><\/p> 7. A express\u00e3o c\u00f4njuge<\/strong> constante do \u00a7 1\u00ba do art. 64 da Lei n. 9.532\/1997 deve ser interpretada em sua acep\u00e7\u00e3o mais ampla, incluindo, para fins de arrolamento de bens, tamb\u00e9m a figura do companheiro<\/strong>. (STJ \u2013 1\u00aa Turma AREsp: 249923 SC Data de Julgamento: 09\/06\/2020, DJe 29\/06\/2020)<\/em><\/p> Ou seja, o entendimento do STJ \u00e9 no sentido de que os bens de um companheiro podem vir a responder por d\u00edvidas tribut\u00e1rias do outro, tal como ocorre no casamento.<\/p> Mas \u00e9 importante notar que a decis\u00e3o do STJ n\u00e3o esclarece se a uni\u00e3o est\u00e1vel em quest\u00e3o era uma rela\u00e7\u00e3o informal ou objeto de contrato ou escritura de conviv\u00eancia. Pelo sil\u00eancio, tudo leva a crer que se tratava de uma rela\u00e7\u00e3o n\u00e3o formalizada, sem qualquer contrato ou escritura. Como consequ\u00eancia, tal como no casamento no regime da comunh\u00e3o parcial de bens, os bens adquiridos na const\u00e2ncia da uni\u00e3o s\u00e3o bens comuns aos companheiros e, portanto, podem responder por d\u00edvidas de ambos.<\/p> Se o caso analisado no STJ tivesse sido de uma uni\u00e3o est\u00e1vel devidamente documentada com a ado\u00e7\u00e3o do regime da separa\u00e7\u00e3o total de bens<\/strong>, \u00e9 bem prov\u00e1vel que o resultado do julgamento fosse outro<\/strong>, ou seja, pela impossibilidade de arrolamento dos bens do companheiro.<\/p> A li\u00e7\u00e3o que se tira desse julgamento \u00e9 a de que \u00e9 important\u00edssimo documentar a uni\u00e3o est\u00e1vel em documento escrito (contrato ou escritura p\u00fablica), fazendo constar o regime de bens adotado pelos companheiros. O documento escrito e a escolha do regime de bens adequado \u00e9 fundamental n\u00e3o apenas para garantir eventual b\u00f4nus patrimonial (partilha e direitos sucess\u00f3rios), como tamb\u00e9m para minimizar o \u00f4nus correspondente.<\/p> David Roberto R. Soares da Silva <\/strong><\/a>\u00e9 advogado especializado em planejamento patrimonial e sucess\u00f3rio, s\u00f3cio do Battella, Lasmar & Silva Advogados<\/a>, e autor do Brazil Tax Guide for Foreigners<\/a><\/strong>, e coautor do Planejamento Patrimonial: Fam\u00edlia, Sucess\u00e3o e Impostos<\/strong><\/a>, e Tributa\u00e7\u00e3o da Economia Digital no Brasil<\/a>,<\/strong> todos publicados pela Editora B18.<\/p> __________________________________________________________________________________<\/p> Temas de uni\u00e3o est\u00e1vel, casamento, namoro, relacionamentos, sucess\u00e3o etc. s\u00e3o tratados de forma clara e objetiva em nosso Planejamento Patrimonial: Fam\u00edlia, Sucess\u00e3o e Impostos<\/span><\/a><\/strong>. Veja o conte\u00fado do livro aqui<\/a><\/strong><\/p>